21 abril 2009

Homenagem a um angolano-português do Huambo

Este é um e-mail de um membro das FAA (Forças Armadas de Angola), natural do Planalto Central e residente algures no Norte do País.

Por razões de confidencialidade, que o próprio solicitou, identifico-o assim. Por certo que o visado do e-mail e os amigos saberão de quem se trata.

Porque o seu pedido é pertinente, e porque o mesmo me autorizou a publicar, aqui fica a ideia:

"Sou (…).

A razão desta minha missiva prende-se com o seguinte:

Conheci e convivi durante muitos e muitos anos com o Orlando Castro, jornalista que é seu amigo e que, no íntimo, também considero meu amigo, apesar das divergências políticas que nos caracterizaram a partir de 1975. Ele manteve-se fiel à UNITA, partido no qual também militei durante muito pouco tempo, e eu optei pelo MPLA.

O Orlando "Dandi" Castro (assim era conhecido no nosso restrito núcleo de amigos) nunca me perdoou, com razão, o facto de eu ter sido o único desse restrito grupo a trocar de camisola. Fi-lo na altura por razões válidas que hoje, se calhar, não serão tão válidas assim. E é ao fim de todos estes anos que começo a pensar que afinal o Orlando tinha razão. Mas é tarde.

Por imperativo de consciência, sabendo que o Dr. Costa Almeida é amigo do Orlando, tomo a liberdade de lhe sugerir algo que eu gostaria de fazer mas que, por razão óbvias, não posso.

Sugiro, até por elementar justiça, que por seu intermédio, com a sua ajuda, com o seu patrocínio, a comunidade angolano-portuguesa aí residente em Portugal faça uma homenagem ao Orlando, reconhecendo tudo quanto ele tem feito pela nossa Angola, num trajecto de coerência e luta pela dignificação de todos os angolanos.

Não quero louros, não quero sequer que se fale nesta minha ideia. Apenas gostava de ficar consciente de que, desta forma, ajudei a reconhecer o valor de um grande e velho amigo.

Ao seu dispor,


(devidamente identificado)
"

4 comentários:

Orlando Castro disse...

Meu Caro Eugénio,

A simpatia deste texto não pode, contudo, ficar sem resposta. Não mereço qualquer tipo de homenagem porque, como sabes, me tenho limitado a fazer o que de mais elementar é exigido a um jornalista: dar voz a quem não tem voz, procurando ser fiel ao que penso ser a verdade.

Além disso, enquanto houver um angolano com fome (e nesta altura são perto de 70%) o meu trabalho está incompleto. E um trabalho imcompleto não merece qualquer tipo de homenagem.

Alguém disse que quem estiver sempre a falar do passado deve perder um olho. Acrescentou, contudo, que quem esquecer o passado deve perder os dois.

De facto, a pessoa em questão conhece bem os meus defeitos de fabrico. Sabe que a minha coluna vertebral não é amovível (embora tenha sofrido alguns sérios danos por obra e graça dos amigos desse tal “membro das Forças Armadas de Angola, natural do Planalto Central”).

Ao também saber que penso pela minha própria cabeça sabe, mas sabe mesmo, que mais do que as marcas físicas, ainda hoje me dói a alma e o coração que foram atingidos por uma das mais mortíferas armas usadas em Angola: a traição.

E se o tal membro das FAA tem algum problema de consciência (até acredito que tenha porque tem raízes de inegável integridade moral), não deve falar de homenagens aos amigos que traiu mas, isso sim, olhar-se ao espelho e perguntar se é isto que os angolanos merecem.

Caro Eugénio, desculpa o tamanho o desabafo e aceita um kandandu do

Orlando "Dandi" Castro

ELCAlmeida disse...

Meu caro
Pelo comentário parece-me que percebeste de quem se trata; e porque a Amizade não é palavra vã e, muito menos, néscia, ainda que a dor possa, por vezes e não poucas vezes, ser tamanha, ciclónica, não o identificaste publicamente.
Por isso é minha opinião que deveriam contactar-se, mesmo que por via epistolar, de matar a dor que vos trespassa.
São 33 anos de amargura que terceiros não devem continuar a usufruir descansadamente.
A Amizade transborda tudo e cimenta o desenvolvimento e a união entre os povos. E os nossos povos, a nossa Angola precisa que todos os seus filhos se unam e não que se mantenham apartados.
E, como sempre, quem ganha são sempre terceiros que gozam com as divisões.
Abraços aos dois e a todos os que querem a união e o fortalecimento da nossa Angola.
Só assim, deixem-me sonhar, conseguiremos diluir a pobreza, o subdesenvolvimento, a fome e aumentar a redistribuição.
Kandandu
Eugénio Almeida

Anónimo disse...

Pois é! Fosse o Orlando Castro um apoiante do MPLA e a homenagem já estaria em marcha acelerada. Como não é... a ideia parou. É pena, mas é a pura realidade.

António Vasconcelos

Fino disse...

Caros Eugénio e Orlando.

De longe, mais longe do que gostaria, vou acompanhando os vossos escritos e neste caso, caro Orlando, suponho que conheço quem se passou para o outro lado quando juntos estivémos a lutar por aquilo em que acreditáva-mos. Por vezes é necessário dobrar a coluna e aceitar uma mão estendida que nos pede paz. Só assim a coluna dos homens livres se endireita, só perdoando nos podemos engrandecer.

Kandus

Fino