O Presidente João Lourenço exonerou hoje uma série
de Chefias Militares e de Segurança e da Casa
Militar ainda que tenha ouvido o Conselho de Segurança Nacional.
Durante o dia, várias pessoas contestaram, recorrendo, sistematicamente, à
nossa Magna Carta, e daí não passando, que era uma sua prerrogativa
constitucional e, como tal, era totalmente legal e constitucional o que decretou.
Contrariavam, desta forma, a minha interpretação quanto à sua legalidade.
Vou tentar explicar porquê, na minha opinião – e será a explicação definitiva,
porque não voltarei a ela –, o diploma de hoje de João Lourenço poderá estar
inquinado de eventual ilegalidade, como adiante explicarei.
De acordo com o artigo 122º da Constituição da República de Angola (CRA) é da
competência do Presidente nomear, exonerar, promover, enquanto Comandante-em-Chefe,
os Chefes militares e de segurança. Isso e indiscutível.
Mas diz a CRA que todos estamos obrigados a respeitar as Leis do País, desde
que estas não interfiram com a CRA. E quando é que isso pode acontecer? Desde que
a lei aprovada (seja por Diplomas, Decretos ou Decretos-leis) não seja
considerada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional (TC).
Qualquer destas Leis só vai ao TC quando acontecer um de duas coisas – ou as
duas: i) o Presidente antes de
ratificar (significa “assinar”) e enviar para ser publicada, solicitar a sua
constitucionalidade ao TC; ou ii) um
grupo de deputados ou um grupo parlamentar, depois de ratificada pelo
Presidente – aqui tenho dúvidas se pode ser antes de ratificada –, solicitar ao
TC a verificação da constitucionalidade da referida Lei.
O TC ou dá como sendo constitucional ou decreta a sua inconstitucionalidade. E
neste caso, poderá ser no todo e terá de ser alterada, ou em parte – e só nesta
parte é que poderá ser alterada.
Ora o que está em causa aqui nas exonerações do Presidente João Lourenço é que
há uma lei dimanada da Assembleia Nacional (AN) de, creio, 21 de Julho que
aprova uma «proposta de Lei sobre os mandatos
dos órgãos de defesa e segurança do país» e que dava poderes ao
Presidente para legislar sobre esta matéria.
Na altura a Oposição contestou, mas não tenho conhecimento que tenha solicitado
ao TC sobre a constitucionalidade da mesma, pelo que o Presidente, nas vésperas
da tomada de posse do novo Presidente – e aqui uma crítica que deixo à CRA por
não contemplar um período de impedimento de legislação do Presidente após as
eleições – legislou nesse sentido. E o decreto presidencial, de 11 de Setembro –
já tinha havido as eleições, daí a minha crítica à falta da tal norma
constitucional – determina que «o início do mandato do comandante-geral e segundos
comandantes da Polícia Nacional de Angola, do diretor-geral e diretores-gerais
adjuntos do Serviço de Inteligência Externa, do chefe e adjuntos do Serviço de
Inteligência e Segurança do Estado, e do chefe e adjuntos do Serviço de
Inteligência e Segurança Militar».
Recordemos
que a Oposição não queria esta Lei porque, e cito, «que alega condicionar o novo Presidente saído das eleições gerais de 23
de Agosto». Ou seja, a oposição sabia que não tendo sido solicitada a
verificação da constitucionalidade da lei – que estaria salvaguardada com uma
alteração que foi feita em vésperas da entrada da nova AN, num pedido urgente
de legislação e que procurava expurgar e salvaguardar «riscos de eventuais inconstitucionalidades» – aquela ao entrar em
vigor seria impossível ao novo inquilino da Cidade Alta, anular o despacho
presidencial que nomeava por «por
quatro anos, prorrogáveis por igual período, limitando as substituições» e
estas só poderão ocorrer.
Assim sendo e tendo entrado em vigor sem que a constitucionalidade da lei tenha
sido posta em causa em lugar próprio e em altura própria, o decreto
presidencial entrou em vigor e ficou salvaguardado pela CRA!
Repito e que fique claro, a CRA é o Livro das Leis que protege a nação e todas
as leis que não sejam consideradas inconstitucionais pelo TC.
E é isso que as pessoas têm de compreender. Se o decreto presidencial não foi
considerado inconstitucional – porque não o foi solicitado, sublinhe-se – o facto
do artigo 122 da CRA dar os poderes que lá estão consagrados ao Presidente, este
não se pode sobrepor a uma Lei que está salvaguardada pela própria CRA!
Ora como não se vislumbra nenhumas das condicionantes, previstas na citada Lei,
que permitam a substituição dos titulares de chefias em causa, é meu
entendimento que o decerto presidencial que exonerou as chefias está inquinado
de ilegalidade.
E, para reforçar esta minha ideia, nada como recordar as palavras do Chefe do Estado-Maior General das FAA, o
General Sachipengo Nunda quando, há dias, dizia que era altura de se
reformar por já ter ultrapassado o limite de idade para a reforma. É que – e todos
assim o interpretaram – Nunda com esta afirmação estava a dar oportunidade ao
Presidente João Lourenço de tornear a lei de 11 de Setembro.
Uma nota final: uma lei ordinária não se sobrepõe uma norma constitucional. Mas depois de ser ratificada e entrar em vigor só poderá ser questionada a sua constitucionalidade, em princípio - aqui reconheço desconhecer qual, e se há, a norma que o prevê - por pedido de um Tribunal de instância média ou superior.
Posteriormente partilhado no portal Pravda.ru: http://port.pravda.ru/cplp/angola/22-11-2017/44441-angola_exoneracoes-0/