Angola é uma
República “soberana e independente,
baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade do povo angolano, que tem
como objectivo fundamental a construção de uma sociedade livre, justa,
democrática, solidária, de paz, igualdade e progresso social” (artº 1º da
Constituição) onde todos “gozam dos
direitos, das liberdades e das garantias constitucionalmente consagrados e
estão sujeitos aos deveres estabelecidos na Constituição e na lei” (artº 22º
§1) além de todos serem “iguais perante a Constituição e a lei” (artº 23º).
Face a isto
é perfeitamente admissível que os angolanos devam usar das suas liberdades
constitucionais para se “exprimir,
divulgar e compartilhar livremente os seus pensamentos, as suas ideias e opiniões,
pela palavra, imagem ou qualquer outro meio, bem como o direito e a liberdade
de informar, de se informar e de ser informado, sem impedimentos nem
discriminações” (artº 40 §1) bem como praticar o “exercício dos direitos e liberdades constantes do número anterior não
pode ser impedido nem limitado por qualquer tipo ou forma de censura” (artº
40 §2).
Se assim é,
e de acordo com o artº 47 da nossa magna Carta, ou seja, da Lei Constitucional
vigente, e que diz o seguinte sobre o direito ao exercício de manifestação “É garantida a todos os cidadãos a liberdade
de reunião e de manifestação pacífica e sem armas, sem necessidade de qualquer
autorização e nos termos da lei” (artº 47 §1) e que “As reuniões e manifestações em lugares públicos carecem de prévia comunicação
à autoridade competente, nos termos e para os efeitos estabelecidos por lei”
(artº 47 §2)
Resumindo os
dois postulados não fazem referência nem condicionam as manifestações em ternos
políticos, sociais ou religiosos, nem tão pouco exigem autorizações governativas
expressas ou condicionam qualitativamente o teor das mesmas. Exigem, somente,
que as mesmas sejam previamente comunicadas, pelo que a aplicação do artº 27º
se faz sentir, ou seja, os direitos, liberdades e garantias constitucionais devem
ser “aplicáveis aos direitos, liberdades
e garantias e aos direitos fundamentais de natureza análoga estabelecidos na
Constituição, consagrados por lei ou por convenção internacional”.
Perante
estes factos constitucionais continuamos a não se compreender as razões que
levam alguns membros do partido dominante, normalmente nunca falam em nome
individual mas em nome do partido – talvez porque intelectualmente não se
sintam seguros do que dizem –, a questionar as razões que levam algumas
organizações a organizarem manifestações que não sejam do agrado desses
dirigentes.
Não quero,
não gosto, de colocar todos na mesma bandeja. Há Dirigentes (e muitos) e
dirigentes (bem demais), e é destes que devemos temer pela sua insuficiência
democrática e harmoniosa que não aceitam nem acatam a existência de vozes
autónomas e independentes.
Só assim se
justifica que uma manifestação organizada pela UNITA em repúdio a uns factos já
publicamente denunciados pela PGR, como foram os lamentáveis casos ocorridos
com os jovens Isaías Cassule e Alves Kamulingue,
levem a haver pessoas que nas páginas sociais tentem denegrir esta manifestação
ou que a juventude do maioritário, que sempre celebrou o aniversário pela via
do Dia da Juventude, a 14 de Abril, em homenagem a Hoji-ya-Henda (José Mendes
de Carvalho) venha agora descobrir que afinal teria sido criada a 23 de
Novembro e por esse facto – coincidência das coincidências – decidir comemorar
o seu aniversário igualmente no mesmo dia que a convocada manifestação. A tal
ponto que as autoridades solicitaram à UNITA que não fizesse a manifestação
para a JMPLA poder comemorar o seu aniversário.
Luanda é enorme, é uma senhora metrópole,
tem muitos arruamentos e por essa via, capacidade para abarcar com várias
manifestações em simultâneo pelo que não se entende as preocupações das
autoridades.
Ou será que temem que os jovens mplistas
não se saibam comportar. Quero crer que não será por esse motivo. Os jovens
podem ser, e são, irreverentes e revolucionários mas não são energúmenos pelo
que não se justifica as preocupações das autoridades.
Estas só têm de condicionar os locais das
manifestações e impedir que as mesmas se confluam.
Como me recordo, nos meus tempos de
estudantes, quando fazíamos as nossas manifestações de fim de ano lectivos
(eram os Liceus, a Escola Industrial e a nossa, a Comercial) cada uma a
manifestar-se nas suas ruas previamente definidas e “comandadas” com a polícia
e com esta a abrir as mesmas manifestações académicas visando que nenhuma se
encontrasse s pudesse provocar algum distúrbio. Nenhuma procurava, mas nenhuma
o evitava!
Se era possível na ditadura colonial, mais
facilmente se pode fazê-lo na nossa democracia.
Nada pode fazer temer as autoridades, nem
o facto da manifestação da UNITA ter o apoio de vários quadrantes e forças
políticas (CASA-CE, PRS, BD, etc.).
Isso só pode reforçar a força da
democracia angolana. Ou será que o Poder não deseja esse reforço. Não o creio,
nem quero acreditar nisso!
Que as duas manifestações ocorram sem
sobressaltos e com a dignidade que se exige.
Cumpra-se a Constituição!
(este apontamento foi citado e retranscrito no semanário Folha 8, ed. 1167, da edição de 23 de Novembro, e no portal do Jornal Pravda.ru, igualmente hoje)